Arquivo mensal: julho de 2019


VICIADO EM NARCISISTA

Por Sheri Heller, tradução de Júlia Bárány, original publicado por Tracy Malone em https://narcissistabusesupport.com/addicted-to-a-narcissist-

Frequentemente encontro pessoas que estão emocional e psicologicamente devastadas pela ruína de um envolvimento romântico com um narcisista maligno. Essas mulheres e esses homens são inteligentes, atraentes e empáticos. No entanto, não conseguem se desvencilhar da insidiosa dinâmica de abuso e violência. Eles estão viciados.

O trabalho de B. F. Skinner com condicionamento funcional nos mostra que o que aprendemos é impactado pelo reforço e pela consequência do castigo/desprazer. Um padrão de intermitente reforço estabelece imprevisibilidade e confusão. O abusador narcisista capitaliza sobre esse fenômeno. A mente da vítima se agita para descobrir o que deve fazer para conseguir reação positiva do abusador narcisista. Eventualmente a dissonância cognitiva se estabelece e a urgência desesperada de discernir uma razão se torna a força motriz.

Nesse ponto, a vítima já está capturada num ciclo viciado e ao mesmo tempo vê o torturador como salvador.

O abusador é deificado pela vítima. A vítima evidencia sinais da Síndrome de Estocolmo, uma forma de vínculo traumático no qual as vítimas se apegam patologicamente ao seu perpetrador.

Este apego patológico é uma estratégia de sobrevivência, que capacita a vítima a se dissociar da dor. Ao negar o horror dessa realidade traumática e adotar a perspectiva do abusador, a vítima afasta a ameaça de desamparo e o terror que de fato vivencia.

O locus de controle da vítima fica centrado em apaziguar e agradar o abusador, mitigando assim o perigo. Com o tempo, a vítima se torna exageradamente identificada com o abusador, ignorando suas próprias necessidades e assumindo a responsabilidade pelo “sofrimento” do abusador. A vítima começa a acreditar que o abuso é culpa sua.

Quando a vítima finalmente chega no fundo e é ou destruída ou descartada pelo narcisista, ou se confronta com as muitas infidelidades, surras, ruína financeira, ou outras formas intensas de abuso, ela/ele pode estar pronto/a para procurar ajuda profissional.

A fim de iniciar um processo de recuperação, é aconselhável a regra do Não Contato, para romper o vínculo tóxico.

A vítima terá o desafio de lidar com sintomas de abstinência, caracterizado pela obsessão compulsiva e transbordamento emocional. Recursos tais como trabalho corporal, meditação e medicação podem ser necessários para estabilizar o sistema límbico desarranjado da vítima.

Conhecimento é poder. Aprender sobre dependência do narcisista e identificar traumas arraigados na sua família de origem que tornam a pessoa vulnerável a ser alvo de vitimização são aspectos críticos da cura. Uma continuidade no tratamento pode penetrar nas profundezas complexas de resgate e reconstrução.

Finalmente, a vida depois do abuso narcisista toma um novo significado para o sobrevivente. Metabolizar a realidade do mal altera a visão de mundo da pessoa. Esta alteração permite ao sobrevivente cultivar limites realistas. Ela incentiva o sobrevivente a se comprometer tenazmente com sua segurança, previsibilidade, e relacionamentos que honram a dignidade pessoal.


REGALIAS DE SER UM PSICOPATA

Por Dr. John Glynn, tradução de Júlia Bárány

(original de 07/07/2019 em: https://psychcentral.com/blog/the-perks-of-being-a-psychopath)

“Sempre trate a todos com respeito. Você nunca sabe quem é um psicopata oculto.” Alex Wayne, Diagnosis

Como é que se identifica um psicopata? Não é nada fácil, mas os pesquisadores já fizeram muitos progressos nas respostas a essa pergunta.

É de conhecimento comum que os homens, mais do que as mulheres, tendem a possuir traços psicopáticos. Por exemplo, um estudo com população carcerária constatou que 31% dos homens atendiam aos critérios, em comparação com apenas 11% das mulheres.

A psicopatia possui várias dimensões dominantes, incluindo Impulsividade Autocentrada, Crueldade e Dominação Destemida. A primeira dimensão, Impulsividade Autocentrada, se associa com impetuosidade, beligerância e narcisismo.

Crueldade se relaciona com incapacidade de experimentar importantes emoções sociais como amor ou remorso.

Os psicopatas, a quem claramente falta empatia, estão em desvantagem – ou assim é que se pensa. No entanto, a empatia requer a consideração dos sentimentos dos outros, colocar-se no lugar dos outros. Colocar-se exige energia. Acontece que os psicopatas não reconhecem nenhum “colocar-se”, a menos que isso envolva passar por cima dos outros para conseguir o que eles querem.

A empatia é construída sobre uma base de emoções. Embora vitais para a conexão e o significado nos relacionamentos, as emoções costumam enublar o julgamento. Quando extremadas, as emoções podem de fato impedir a capacidade do pensar crítico. Lembrem-se, estamos em 2019, o ano em que as massas estão supersensíveis, com as emoções constantemente enublando o pensamento racional.

O psicopata, livre de seus grilhões emocionais, está bem equipado para agir de forma irrestrita e impiedosa. Má notícia para a sociedade… mas não para o psicopata, especialmente aquele que se consome com pensamentos de poder e prestígio.

Dominação Destemida, a terceira dimensão da psicopatia, está associada à insolência e ao desejo por influência social. Contrário à crença popular, a Dominação Destemida é acompanhada por vários comportamentos socialmente adaptativos. Equipados com um senso de elegância e poder interpessoal, temeridade física e resiliência emocional, alguns psicopatas alcançam grandes feitos. Alguns até se tornam heróis.

Um artigo de 2015, intitulado “Psicopatia bem-sucedida”, apresenta aos leitores um homem chamado Forest “Tommy” Yeo-Thomas, um demônio atrevido da vida real. Usando diversos disfarces e documentos falsos, o espião britânico da Segunda Grande Guerra regularmente escapava de ser capturado pelos nazistas. Segundo os autores, Yeo-Thomas numa ocasião fingiu ser um cadáver viajando num caixão.

Conhecido por seus inimigos como o “Coelho Branco”, Yeo-Thomas certa vez pulou de um trem em movimento. Num gesto diretamente saído de um filme de Liam Neeson, o nosso herói (anti-herói?) certa vez estrangulou um guarda carcerário com suas mãos. Quando Yeo-Thomas não estava ocupado estrangulando nazistas, ele estava ocupado seduzindo belas mulheres.

A maioria das pessoas, presumo, não conhecem a vida e a época de Yeo-Thomas. No entanto, a maioria conhece James Bond, sua encarnação ficcional. Sim, Yeo-Thomas inspirou o herói ostentoso, maníaco sexual, bebedor de Martini do romancista Ian Fleming. O espião WW2 é típico do que na profissão chamamos de “psicopata bem-sucedido”. Diferente da psicopatia maligna, que costuma envolver atos criminais e prisão, o “psicopata bem-sucedido” abraça as trevas para alcançar sucesso de vida real.

Será que os “psicopatas bem-sucedidos” evitam transgredir a lei porque é “certo”? Não, eles evitam transgredir a lei porque isso faz sentido. Ao manter seus impulsos na rédea curta, ou pelo menos canalizando-os numa direção mais lucrativa, os “psicopatas bem-sucedidos” costumam chegar a ocupar cargos de real importância.

Então, que tipo de profissões atrai psicopatas? A pesquisa já mostrou que psicopatas são mais prevalentes em determinadas ocupações. Não é nada surpreendente que eles tendam a gravitar para posições de poder – pense em CEOs, cirurgiões, advogados, celebridades e políticos.

O vínculo entre política e psicopatia é especialmente interessante. Em 2004, cientistas pediram a 121 biógrafos presidenciais que avaliassem 42 presidentes dos Estados Unidos, até inclusive George W. Bush, quanto aos seus traços pré-eleição de Dominação Destemida, uma das três dimensões de psicopatia. As descobertas são de leitura interessante. De acordo com o relatório, Dominação Destemida estava fortemente correlacionada com o desempenho presidencial em geral, sua orientação, percepção do público, persuasão, e, bem previsivelmente, disposição para arriscar.

OK, sabemos muito sobre quem pode ser um psicopata, mas e quanto ao onde? Existem determinados lugares nos Estados Unidos onde os psicopatas tem maior probabilidade de aparecer e poluir o ambiente social?

Felizmente para nós, um estudo recente publicado no diário científico Helyon nos fornece uma resposta inequívoca. Segundo os autores, que estimaram a prevalência de psicopatia baseado nos Cinco Maiores traços de personalidade de ordem superior (Abertura para a experiência, Conscienciosidade, Agradabilidade, Extroversão e Neuroticismo ou instabilidade emocional), Washington D. C. tem a maior prevalência de psicopatas. Mestres vigaristas, exímios manipuladores malignos (Svengali), faz sentido que psicopatas se arrebanhem numa região dos Estados Unidos sinônima de poder e influência política.

Como o inimitável Jon Ronson escreveu certa vez: “Psicopatas fazem o mundo girar… a sociedade é uma expressão desse tipo específico de loucura… Eu sempre acreditei que a sociedade fosse uma coisa fundamentalmente racional, mas e se não for? E se for edificada sobre insanidade?”

O antigo ditado reza que nunca estamos a mais de dois metros de distância de um rato. Talvez a mesma coisa possa ser dita de psicopatas.