COMO É POSSÍVEL ESTAR APAIXONADA PELO SEU ABUSADOR?
Por Júlia Bárány, baseado no texto de Donna Andersen: https://lovefraud.com/vicky-cilliers-is-unable-to-acknowledge-that-her-husband-tried-to-murder-her-by-tampering-with-her-parachute/
Ouço histórias contadas por advogados que tentam por todos os meios legais proteger as vítimas de abuso psicopata quando, no momento crítico, quando o caso parece que vai se resolver, a própria vítima passa a defender o seu abusador. Então o caso desmorona e a vítima perde tudo a que tinha direito, e às vezes mais.
Também em situações sociais ou familiares isso acontece: a vítima que sofre de abuso na intimidade do lar, defende perante os outros o próprio abusador, anulando qualquer chance de se livrar do abuso.
Donna Andersen, em seu artigo acima citado, conta a história de Victoria Cilliers, a segunda esposa de Emile, que foi condenado diante de provas irrefutáveis, por ter tentando matar sua mulher e seus dois filhos.
Emile Cilliers é um sargento do exército britânico. Em abril de 2015 ele danificou o paraquedas de Vicky antes de ela saltar (os dois praticavam o paraquedismo). Ela caiu por 1.300 metros, ficou gravemente ferida, mas milagrosamente se salvou. No início daquela mesma semana, Emile danificou o encanamento de gás da casa deles. Caso tivesse explodido, teria matado Vicky e os dois filhos.
Embora o tribunal o julgasse culpado, Vicky não consegue acreditar que o marido seria capaz de assassiná-los. Ela declara que não pretende divorciá-lo e disse aos filhos que o pai “está fora trabalhando”.
As evidências de que Emile Cilliers é um psicopata são:
Ele tentou matar sua esposa duas vezes no espaço de uma semana.
Ele queria estar com sua amante e se livrar das dívidas – matando Vicky e recebendo o seguro de vida dela ele realizaria as duas coisas.
Ele mentia. Muito.
Ele tinha dois filhos com sua namorada da adolescência e os abandonou a todos.
Ele se casou com a primeira esposa sem terminar o relacionamento com a primeira namorada.
Ele se casou com a segunda esposa, Vicky, mas continuou frequentando a cama da primeira esposa.
Ele praticava sexo casual e frequentava clubes de sexo.
Ele buscava excitação a todo custo.
Ele proclamava sua inocência apesar de substancial evidência de ser culpado.
Vicky admite que o marido mentia, desviava dinheiro e a traía. Então, por que ela não acredita que ele podia matá-la?
A resposta: dissonância cognitiva, vício no psicopata e Síndrome de Estocolmo, ou vínculo traumático.
Dissonância cognitiva é um estado que se baseia na necessidade de os seres humanos estabelecerem harmonia entre suas crenças e suas ações. A dissonância e o conflito são gerados quando não há essa harmonia, quando acreditamos em algo que depois os fatos desmentem, ou quando nossas crenças e nossas ações não combinam.
Para resolver essa dissonância, lançamos mão das seguintes estratégias:
- Mudamos a crença ou a conduta
- Buscamos novas informações que contrapesam a crença dissonante
- Reduzimos a importância das crenças
Como é que uma pessoa se vicia no psicopata?
- O prazer do início do relacionamento estabelece um vínculo psicológico.
- A segunda fase do relacionamento, quando o psicopata começa a criar medo e ansiedade, ameaça de abandono, tratamento dúbio uma vez agrada outra vez repele, fortalece o vínculo psicológico.
- A vítima busca alívio da angústia e do medo junto ao próprio psicopata, o que estreita ainda mais o vínculo psicológico.
Segundo Donna Andersen, Vicky já tinha o vínculo traumático com o abusador antes do acidente com o paraquedas. Tendo que lutar com as graves consequências do acidente e dois filhos pequenos, sua psique estava sobrecarregada. Ela não conseguiria processar mais um choque que é o fato de o marido ser um assassino. Negando, ela se protegeu de algo que a poderia desestruturar completamente. Talvez um dia ela seja capaz de ver os fatos como eles são.